Hanseniase
Hanseniase

 

Introdução

 

A Hanseníase é uma doença muito antiga, tendo relatos dela desde 4.000 anos antes de Cristo, no Egito Antigo.

            Nas Américas, a Hanseníase se espalhou através do “descobrimento”. No Brasil, a Hanseníase veio com os colonizadores e escravos.

            A Hanseníase é causada pelo agente etiológico Mycobacterium leprae de baixa patogenicidade.

         A infecção acomete de preferência a pele, o sistema nervoso periférico, podendo também invadir as mucosas nasais, orofaríngeas e laríngeas, olhos e vísceras, sendo poupado somente o sistema nervoso central.

 

1. Etiologia

 

         O Mycobacterium leprae, pertence à ordem Actinomycetales e à família Mycobacteriaceae, é um bastonete gram positivo, álcool-ácido- resistente.

         Os bacilos de Hansen podem estar dispostos isoladamente ou em grupos, constituindo formações globosas denominadas globias.

         Essa conformação em globias é característica deste bacilo, sendo importante para distingui-lo de outro microorganismo com morfologia e coração parecida.

         Os bacilos de Hansen podem apresentar-se corados uniformemente (bacilos sólidos) ou irregularmente (bacilos granulosos ou fragmentados).

         Os bacilos sólidos representam as bactérias vivas, enquanto os granulosos, as bactérias mortas. A proporção entre os bacilos sólidos e granulosos em um esfregaço, índice morfológico (IM), permite uma avaliação periódica dos pacientes, possibilitando verificar o aparecimento de resistência a medicamentos ou abandono do tratamento.

 

2. Epidemiologia

 

         A Hanseníase é uma doença endêmica no Brasil, ultrapassando a prevalência mínima de um caso / 1.000 habitantes (no Brasil a prevalência é de 1,5 / 1.000).

         A prevalência da Hanseníase é maior em países tropicais, e estima-se que hoje no mundo haja 10 milhões de infectados. No Brasil existem cerca de 400.000 a 500.000 doentes.

         O aumento da incidência da Hanseníase no país, agrava a situação epidemiológica. A região com maior incidência da doença é o Sudeste, porém a situação agravou-se mais na região Nordeste.

         A Hanseníase até pouco tempo era considerada uma doença que somente acometia humanos, porém foram descritos casos em chimpanzés, macacos e tatu, que podem ser os transmissores indiretos da doença.

         Atualmente, a maior prevalência da Hanseníase se encontra no Sudeste Asiático, seguido de regiões da África e das Américas. O Brasil é o segundo país com o maior número de casos registrados, estando atrás apenas da Índia. No Brasil, após a assinatura do compromisso para a eliminação da Hanseníase, em 1991, houve uma redução da prevalência de 60% , em decorrência das altas por cura, no entanto, houve um aumento na detecção de casos novos em mais de 100%.

 

Embora a Organização Mundial da Saúde (OMS) esteja anunciando a eliminação da Hanseníase como problema de saúde pública, isto é, chegar a uma prevalência de menos de um paciente para cada 10.000 habitantes, no início do terceiro milênio, a doença continua sendo um sério problema no mundo.

 

3. Patogênese

A porta de entrada do Mycobacterium leprae no organismo humano não é rigorosamente conhecida. A principal via de penetração é constituída pelo trato respiratório superior (mucosa nasal), depois da inalação de gotículas contaminadas (tosse, espirro, coriza). Alguns autores admitem que o antígeno também penetre através da mucosa ocular. Outra importante via de penetração do bacilo de Hansen seriam soluções de continuidade existentes na pele.

Após a penetração, o antígeno tende a localizar-se nos linfonodos regionais. O exame de material obtido por punção ganglionar de comunicantes íntimos (pessoas que vivem na mesma casa) de doentes com hanseníase, pode detectar precocemente a infecção, sem que minucioso exame dermatológico e neurológico revele qualquer manifestação clínica da doença.

 

O estudo da resistência do organismo humano ao Mycobacterium leprae é de extraordinária importância para a caracterização das formas clínico-imunológicas da hanseníase, podendo na prática ser avaliada pelo Teste de Mitsuda.

 

A reação de Mitsuda é um teste imunobiológico por intermédio do qual se pode avaliar o grau de resistência do organismo humano à infecção por Mycobacterium leprae. Esta reação não é útil para o diagnóstico de hanseníase, pois 90% das pessoas adultas sadias, tanto em regiões endêmicas quanto em não-endêmicas, são Mitsuda-positivas, ou seja, já entraram em contato com o bacilo e desenvolveram resistência a ele.

 

A reação de Mitsuda é interpretada como se segue:

  • Reação negativa (-) : Significa tolerância, ou seja, falta de capacidade de o organismo destruir os bacilos injetados.
  • Reação duvidosa (+/-)
  • Reação positiva fraca (+)
  • Reação positiva (++): Indica a capacidade de o organismo humano destruir o antígeno.
  • Reação positiva forte (+++)

 

Há evidências de que a resistência à infecção é geneticamente determinada. Todos os seres humanos nascem Mitsuda-negativos; gradualmente, com o aumento da idade, o índice de positividade vai se tornando maior. Entre os adultos, 90% são Mitsuda-positivos.

 

4. Imunidade

         O Mycobacterium leprae é um parasita intracelular obrigatório, que se multiplica no interior de macrófagos. Em sua sede intracelular os anticorpos específicos que se formam não são capazes de atingi-lo. Os mecanismos de defesa contra os bacilos de Hansen estão intimamente relacionados com a imunidade celular.

 

 

5. Formas Clínicas

   De acordo com a “classificação sul-americana”, as formas clínicas da hanseníase são classificadas de acordo com critérios clínicos, bacteriológicos, histopatológicos e imunológicos.

 

   A divisão clássica da hanseníase é :

 

  • Formas polares de Rabello : 1) Tipo Tuberculóide

                                                  2) Tipo Virchowiano

 

  • Grupos instáveis : 1) Grupo Indiferenciado ou Indeterminado

                                   2) Grupo Dimorfo ou Bivalente

 

6. Quadro Clínico

Na hanseníase não existe cancro de inoculação; não existe lesão no ponto correspondente à porta de entrada do antígeno na mucosa ou na pele.

O período de inoculação possui duração muito variável, sendo de difícil avaliação. Mais freqüentemente é de dois a cinco anos, podendo ser mais curto (alguns meses) ou mais longo (de até dez anos).

Como o bacilo de Hansen tem tropismo especial pela pele e pelos nervos periféricos, as manifestações clínicas da doença resumem-se:

 

  • A) Síndrome Nervosa
  • B) Síndrome Cutânea

 

A)   Síndrome Nervosa

 

A síndrome nervosa é comum a qualquer das formas clínicas da hanseníase, na evolução das quais pode surgir, mais cedo ou mais tarde.

 

É menos freqüente em nosso meio a instalação da hanseníase através de sintomas e sinais neurológicos (parestesias, formigamentos, adormecimentos, hiperestesias e áreas de anestesia), localizados principalmente nos membros inferiores.

 

As neurites hansenianas provocam distúrbios de sensibilidade, de motricidade, e de troficidade. Os distúrbios sensitivos caracterizam-se,inicialmente, por hiperestesias (processo irritativo e inflamatório das fibras sensitivas). Depois, são seguidas de hipoestesias e anestesias (destruição dos filetes sensitivos).

As neurites hansenianas são, principalmente, periféricas.

 

B)  Síndrome cutânea

 

  • Hanseníase indiferenciada ou indeterminada:   

Acomete exclusivamente a pele e os nervos periféricos. Nessa forma, encontram as manifestações neurológicas mais leves da doença, representadas por áreas de anestesia. A percepção dessas áreas é geralmente precedida ou acompanhada de anidrose (sem transpiração).

Nas manifestações cutâneas estão presentes manchas, ressecamento da pele e rarefação ou ausência de pêlos. As manchas podem ser:

 

  • Hipocrômicas: Mais freqüentes. Constituídas por áreas esbranquiçadas únicas ou múltiplas, encontradas em qualquer região do tegumento.

 

  • Eritêmato-hipocrômicas: Máculas hipocrômicas nas quais surgem eritemas em suas margens - cor róseo-claro.

 

  • Eritematosas planas: Predominância do eritema. Cor variando de róseo-claro a vermelho intenso.

 

A pesquisa direta de bacilos de Hansen (BAAR) em esfregaços do muco nasal ou serosidade de lesões cutâneas é em geral negativa; quando positiva, é muito pequeno o número de bacilos encontrados.

A Reação de Mitsuda pode ser positiva ou negativa, servindo de orientação segura para estabelecer a tendência evolutiva dos casos.

Quanto a evolução, as manchas podem permanecer inalteradas durante um tempo prolongado, regredindo espontaneamente para a cura ou evoluir para o tipo virchowiano ou para o tipo tuberculóide da hanseníase.

 

  • Hanseníase tuberculóide:

É a forma benigna de hanseníase, não bacilífera, e portanto, não contagiosa. Nessa variedade clínica descrevem-se a forma tórpida (baciloscopia negativa, benigna por excelência) e a forma tuberculóide reacional (menos estável, com bacilos presentes nas lesões cutâneas que pode evoluir para o grupo dimorfo ou para o tipo virchowiano).

 

  • Forma tuberculóide tórpida: As lesões encontradas nessa forma são:

 

- Microtubérculos: pequenas elevações com cor de pele normal ou tornando-se róseas ou pardacentas com alterações da sensibilidade.

 

- Figuradas ou marginadas: área central de aparência normal, hipocrônica ou eritematosa com a borda formada por microtubérculos. Sempre se detecta anestesia térmica e dolorosa.

 

-Tubérculos: Lesões bem mais raras, com coloração vermelho-vivo, superfície lisa e discreta descamação.

 

          Todos os tipos de lesões de hanseníase tuberculóide se distribuem de modo assimétrico pelo tegumento cutâneo.

A evolução dessas lesões é crônica, aumentando de tamanho lentamente e podendo sofrer exacerbações súbitas e aumento das dimensões. Cessado o surto, readquirem as características de evolução lenta.

 

A baciloscopia feita com material das lesões é, quase sempre, negativa. A reação de Mitsuda é quase que invariavelmente positiva.

                      

  • Forma tuberculóide reacional: As lesões apresentam-se geralmente como placas vermelho-vinhosas, edematosas, com formas e dimensões variáveis e limites nítidos, distribuindo-se de modo assimétrico pelo tegumento cutâneo. Os surtos reacionais não são habitualmente acompanhados de febre nem de comprometimento do estado geral, podendo ocorrer em alguns casos dores articulares.

 

Essa forma apresenta evolução aguda ou subaguda. As lesões podem aparecer em indivíduos aparentemente sadios, como primeira manifestação da doença ou como forma secundária do tipo tuberculóide tórpido ou do grupo indeterminado.

A baciloscopia é geralmente positiva na fase aguda da doença, encontrando-se bacilos em grande número, principalmente em material de lesões cutâneas. Com a cessação do surto, a baciloscopia torna-se negativa e o teste de Mitsuda, positivo. Nos casos com baciloscopia positiva a reação de Mitsuda é negativa.    

 

·         Hanseníase Virchowiana

       A Hanseníase Virchowiana caracteriza-se pela ausência de resistência à penetração, à multiplicação e à disseminação do Mycobacterium leprae em todo o tegumento cutâneo, estendendo-se a infecção à mucosa nasal e faríngea, aos olhos, as víceras e aos nervos periféricos. As manifestações da doença são estáveis, com tendência a piora progressiva.

As lesões cutâneas são constituídas por eritema e infiltração virchowiana difusa, manchas eritematosas ou eritopigmentares, nódulos e tubérculos. Eritema e infiltração difusa ocorre em praticamente todos os casos. No início esses sinais são muitos discretos e de difícil detecção, constituídos apenas por eritema avermelhado com limites imprecisos e difusos. Evoluindo muito lentamente o eritema vai se acentuando até caracterizar-se a infiltração, que aumenta progressivamente e torna a pele espessada. O eritema e a infiltração difusa localizam- se preferencialmente em face, fronte, regiões malares, pirâmide nasal, pavilhões auriculares, antebraços, regiões glúteas, coxas e pernas. Em alguns casos são tão extensos que apenas são poupadas as regiões axilares e inguinais. Em casos avançados, o eritema e a infiltração difusa acentuam-se tanto, que chegam a formar dobras na face, dando origem à fácies leonina.

        A rinite hanseniana caracteriza-se por coriza crônica, com secreções e episódios repetidos de pequenas epistaxes (formação de crostas e obstrução nasal); o acometimento da mucosa nasal pode determinar ulcerações no septo, com desabamento da pirâmide nasal.

        Na Hanseníase Virchowiana, as lesões podem ser encontradas em fígado (com presença de hepatomegalia), baço, epidídimo e testículos. O acometimento testicular pode ser responsável por esterilidade, frigidez sexual, impotência e, com alta freqüência, ginecomastia.

 

7. Reações Hansênicas:

  • Em muitos pacientes virchowianos podem ocorrer manifestações agudas localizadas na pele, olhos, nervos e testículos, que recebem o nome re reações hansênicas.

 

  • Existem 2 tipos de lesões:

 

1)     Lesões do eritema nodoso – São nódulos de dimensões variáveis, assumindo desde o tamanho de uma ervilha até de uma noz. Esta ocorre devido à deposição de imunocomplexos (constituídos por antígenos e anticorpos), que se depositam na parede de vasos e tecidos, nos quais se desenvolve reação de hipersensibilidade.

 

2)     Lesões do eritema polimorfo – São placas eritematovesiculosas ou bolhosas, com formas e dimensões variáveis, e coloração róseo-palida. Localizam-se também nos membros e no tronco.

 

 

          Obs: Tanto o eritema nodoso quanto o eritema polimorfo são acompanhados invariavelmente de outras manifestações: febre alta, artralgias, astenia, adenopatia, neurites.

 

 

8. Diagnóstico

Para o diagnóstico da hanseníase há os exames específicos e os inespecíficos.

Os exames específicos compõem-se de: pesquisa da sensibilidade, prova de histamina e prova de pilocarpina.

 

8.2. Pesquisa da sensibilidade:

Na hanseníase, são muito freqüentes alterações da sensibilidade superficial. Decorre desse fato, a importância da pesquisa das alterações da sensibilidade superficial térmica, dolorosa e tátil.

            Ao realizar o exame de sensibilidade superficial, deve-se primeiramente esclarecer ao doente quanto às características dos testes a que vai ser submetido.

          O paciente deverá ser mantido com os olhos fechados durante a pesquisa. Esta deve sempre ser iniciada em pele normal, com o objetivo de se avaliar a disposição do paciente a colaborar ou falsear as respostas.

          Para pesquisa da sensibilidade térmica, empregam-se dois tubos de ensaio, um contendo água fria e o outro contendo água quente. Então, encostam-se os tubos alternadamente, rápida e levemente, de início em áreas de pele sã e depois na superfície de lesão, indagando ao paciente se o tubo em contato com a pele é o quente ou o frio.

 

          A pesquisa da sensibilidade dolorosa é feita com o auxílio de uma agulha, responder se o toque foi feito pela extremidade fina ou grossa do instrumento.

          Na pesquisa da sensibilidade tátil, recomenda-se tocar a pele do paciente com uma mecha de algodão e solicitar a este que coloque o dedo no ponto encostando-se alternadamente a ponta e a cabeça da agulha, devendo o paciente tocado.

           

8.2. Prova de histamina:

1) Depositar uma gota de cloridrato ou fosfato de histamina sobre a lesão suspeita e sobre a superfície da pele normal.

 

2) Fazer uma picada superficial da pele através da gota com uma agulha esterilizada, sem produzir hemorragia;

 

3) Observar atentamente se ocorre aparecimento de eritema secundário ao nível da lesão, e comparar com o resultado observado na pele normal.

 

Em pele normal verifica-se uma série de alterações cutâneas, conhecidas como tríplice reação de Lewis:

 

  • 20 a 40 segundos depois, no ponto da picada, surge eritema circunscrito, resultante da ação direta da histamina sobre os capilares da derme;      
  • Um a dois minutos após, observa-se o aparecimento de eritema reflexo secundário (esse eritema reflexo corresponde a reação característica da pele normal, só ocorrendo quando esta integro o arco reflexo nervoso);
  • Após dois ou três minutos, no próprio local da picada , aparece uma pápula arredondada anêmica, determinada pela exosserose.

 

Na hanseníase, a reação à histamina é incompleta, não se formando o halo eritematoso reflexo.

A prova da histamina, é utilizada particularmente em índividuos com baixo nível intelectual, em crianças e em adultos nos quais, por qualquer motivo, a pesquisa de sensibilidade superficial é difícil ou impossível de ser realizada.

Prova de pilocarpina: É usado para avaliar a presença de anidrose, fenômeno que quase sempre acompanha as lesões da hanseníase.         A prova consiste  na injeção intradérmica de solução de cloridrato ou nitrato de pilocarpina na área da pele suspeita e na pele vizinha normal, pincelando-se previamente estas áreas com tintura de iodo, posteriormente pulveriza-a com amido.

O suor em contato com o iodo dá cor azul ao amido.

Essa prova é indicada em casos com lesões eritematosas ou com placas infiltradas eritematosas e em negros.

 

 

 

8.3. Exames Específicos

Os exames específicos para o diagnóstico de hanseníase são constituídos por:

 

a)    Pesquisa direta de bacilos alcóol-ácido-resistentes (BAAR) em material obtido por escarificação das lesões cutâneas,por raspagem da mucosa nasal e em serosidade obtida por punção do lobo da orelha;

 

b) Exame histopatológico de fragmento de pele suspeita;

 

 

c) Teste de Mitsuda.

 

Deve-se ressaltar que não há meios de cultura adequados para o crescimento do Mycobacterium leprae.

 

9. Tratamento

 Os medicamentos mais utilizados atualmente no tratamento específico da hanseníase são as sulfonas,a rifampicina e a clofazimina.

 

  • Sulfonas: Na atualidade tem-se dado preferência ao emprego da denominada sulfona-mãe ou dapsona; tem sobre os outros derivados da sulfona a vantagem de ter baixo custo e por ser administrada por via oral. É um  medicamento bastante efetivo para o tratamento de hanseníase, pois combina eficácia com baixo custo. A dapsona é bem absorvida por via digestiva. É eliminada principalmente pelos rins e, em pequena quantidade, pelas fezes. A dose diária indicada é de 100mg para adultos e de 0,9 a 1,4mg/kg para crianças. Há efeitos adversos sendo o mais freqüente a anemia hemolítica, mas podem também ocorrer redução da vida média da hemácia, gastrite, dermatite e psicose. A dapsona torna inviáveis os bacilos de Hansen no fim de três a quatro meses de tratamento dos doentes com a forma virchowiana (forma mais grave e contagiante). Infelizmente, nos últimos anos vêm sendo relatados casos de hanseníase virchowianas resistentes à dapsona. A mais alta prevalência até agora registrada foi na Costa Rica. O emprego de doses baixas e a irregularidade do tratamento favorecem o aparecimento de resistência do Mycobacterium leprae à dapsona. A resistência secundária (que surge durante o tratamento) está limitada ao tipo virchowiano da doença; o período para o aparecimento da resistência à dapsona varia de três a 24 anos.

 

  • Clofazimina: É um corante vermelho-alaranjado derivado da fenazina,com tropismo pelas células do sistema reticuloendotelial e dotado de atividade antiinflamatória. Exerce efeito bacteriostático sobre o Mycobacterium leprae, sendo de ação lenta no tratamento da hanseníase. A dose indicada para adultos é de 100mg,por via oral, três vezes por semana. Os resultados terapêuticos são semelhantes aos obtidos com a sulfonas, não tendo sido relatada a ocorrência de resistência bacteriana ,até o presente. Sua eficácia é única ,pois combate a infecção e controla reação. Doses terapêuticas da clofazimina, podem determinar o aparecimento de pigmentação avermelhada da pele e ressecamento cutâneo. Náuseas, dores abdominais e constipação intestinal são outros efeitos colaterais observados.

 

  • Rifampicina: É o medicamento disponível na atualidade de ação mais rápida e de maior eficácia contra o Mycobacterium leprae, sobre o qual tem ação bactericida. Sua rápida atividade sobre os bacilos de hansen deve-se provavelmente à inibição da síntese do ácido ribonucléico bacteriano, tornando inviáveis os microrganismos no fim de sete a 20 dias. É também eficaz contra os bacilos sulfono-resistentes.

 

É administrada na dose diária de 600mg,por via oral, para adultos e de 10mg/kg para crianças. Medicamento bem absorvido no tubo digestivo e distribui-se por todo o organismo. Seus efeitos adversos incluem ,náuseas, desconforto abdominal, hepatite, púrpura trombocitopênica, insuficiência renal e choque.

 

  • Introdução da Poliquimioterapia (PQT) :A recomendação feita para esquemas padrão de PQT, realizada pela primeira vez por um Grupo  de Estudos sobre Quimioterapia da OMS em 1981, iniciou uma nova era do otimismo. O que parecia impossível 10 anos atrás, apresenta-se agora como uma realidade com o surgimento da PQT-um tratamento simples e relativamente barato. A PQT é bem aceita e tolerada pelos pacientes, além de ser altamente efetiva. Cura rapidamente os pacientes, e interrompe a cadeia de transmissão ,fazendo com que seja possível a eliminação da doença. A PQT é tão efetiva, que mesmo aplicada por unidades de  saúde com recursos e infra-estrutura limitados, poucos pacientes deixam de responder a seus efeitos. Estima-se que, se comparada com a monoterapia sulfônica, a PQT em 1995 já preveniu entre 500 mil e um milhão de casos de recidiva.

A PQT também previne o aparecimento de deformidades e melhora a atitude da comunidade.

 

9.1. Esquemas de Tratamento

  • Doentes com hanseníase virchowiana ou pertencentes ao grupo dimorfo: Administração diária, por via oral, de dose única de 600mg de rifampicina (de manhã, em jejum) e 100mg de dapsona (após o almoço), durante três meses seguidos; depois do terceiro mês manter a dapsona, na mesma dose, por tempo indefinido.

 

  • Doentes com hanseníase sulfono-resistentes: Administração em dose única diária, por via oral, de 600mg de rifampicina (pela manhã,em jejum) e de 100mg de clofazimina (depois do almoço), durante três meses seguidos; após o terceiro mês, manter a mesma dose diária de clofazimina durante tempo indefinido.

 

 

  • Doentes com hanseníase tuberculóide: Administração, por via oral, de dose única diária de 100mg de dapsona (após o almoço), durante 18 meses seguidos após a inativação da doença, nos casos de Mitsuda positiva.

O tratamento da Hanseníase é um assunto muito complexo, e não se trata somente de se contar com medicamentos que destroem os bacilos. A doença ataca os nervos periféricos, provocando deformidades e incapacidades, que são responsáveis pela marginalização  psico-social do indivíduo. A presença da incapacidade, a sua correção cirúrgica quando já instalada, e a educação do doente e da comunidade em que vive fazem parte da terapêutica e não podem ser esquecidas.

10. Profilaxia

O diagnóstico e o tratamento precoces contribuem para diminuir a disseminação do Mycobacterium leprae, impedindo a evolução dos casos incipientes para formas contagiantes. A terapêutica dos doentes virchowianos e do grupo dimorfo com os medicamentos atualmente utilizados, principalmente com a associação de rifampicina e dapsona, interrompe a transmissão no fim de poucos meses, contribuindo indiretamente para reduzir o número de casos novos da doença. Com o objetivo de estimular a imunidade celular, o BCG pode ser administrado a indivíduos suscetíveis expostos e mesmo para doentes do grupo dimorfo ou do grupo indeterminado Mitsuda-negativos. A dapsona pode ser indicada profilaticamente, na dose de 100mg/dia, para adultos, aos comunicantes familiares, com menos de 25 anos. Essa conduta não é universalmente aceita, ressaltando-se sempre a importância da observação médica dos comunicantes. Não existe VACINA contra a HANSENÍASE.